No fim de uma tarde enevoada passei pela praia da Foz do
Arelho onde fiz alguns registos. Ao fotografar um vendedor de bolas de berlim
não pude impedir-me de recordar, com alguma nostalgia, um tempo de praia que
passava mais devagar. Como se rebobinasse um filme no qual já fui actor –
integrando rituais familiares na organização de expedições à praia, repetidos
diariamente durante os meses de Verão. Entravam sempre, todos os anos,
personagens típicos como se tivessem saído das “Férias do Sr. Hulot”. Havia uma
baronesa mumificada, de cão miniatura ao peito, em pose de diva (tipo Sunset
Boulevard), o grupo de atletas que fazia forças combinadas em pleno areal, o
intelectual de cachimbo, o casal de estrangeiros, as avós a fazerem tricô sem
parar, as “vamps” e o tenista galã, o grupo dos piqueniques no pinhal, o cabo
de mar e os nadadores olímpicos, crianças chilreando em redor da tenda dos
fantoches ou entre baldes, bóias e construções de areia para o mar desfazer
pouco depois.
No meio da calma e do calor ecoavam os pregões da preta das bolas de berlim e
dos pacotes de batas fritas, do homem dos barquilhos, do vendedor de “Rajá
fresquinho” e do “estica e chocolate prá menina e pró menino”. Como figuras de
cal percorriam a praia de lés a lés sobre a tremulina do calor, junto á areia,
como figurantes de um filme de Fellini.
As senhoras e as meninas jogavam ao prego e ao ringue, enquanto os rapazes liam
primeiro a “colecção Joaninha” e depois as aventuras do Zorro e do Capitão Marvel
– mais saborosas durante as manhãs enevoadas.
Tudo aparentemente certo como previsto. Ninguém falava sobre qualquer tipo de
preocupação. Tudo estava bem, sentíamo-nos rodeados de segurança naquele
Presente e tínhamos poucas interrogações sobre o Futuro. Algo que sinto estar
cada vez mais longe neste mundo "suicidário" em que hoje vivemos.
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