Julgamos que o denominado Jardim da Rainha foi (re)criado, depois de 1891, aquando da reordenação dos espaços que viriam a ser o Parque e a Mata das Caldas da Rainha, no final do Sec. XIX, projectada e mandada executar por Rodrigo Berquó, integrando uma estratégia de complementaridade de equipamentos de lazer com o Hospital Termal. A Rainha a quem foi dedicado este pequeno jardim foi, muito provavelmente, a Rainha D. Amélia que, nesse tempo, visitava frequentemente as Caldas acompanhada pelo seu marido: o rei D. Carlos I – cujo nome foi atribuído ao Parque.
Tenho a opinião de que a concepção deste Jardim obedeceu a uma lógica precisa.
Por um lado está situado quase como uma charneira/transição entre o Parque e a Mata e em frente do Palácio Real que albergava a família real durante as suas estadias, e por outro foi construído um pequeno miradouro, num plano superior, com gradeamento sobre o jardim, onde várias cadeiras proporcionariam a contemplação daquele espaço. Acresce que alguns dos muros que rodeiam o jardim foram dotados, na face superior, de goteiras onde escorria água para os pássaros, cujo habitat era a Mata, virem beber. A vegetação e as flores obedeceram também ao mesmo critério. Isto é, atrair aves ou insectos propiciando o espectáculo “ao vivo” da Natureza aos olhos de quem se sentava no miradouro. Assim a família real poderia assistir, como se estivesse num camarote, ao desenrolar da interacção de insectos polinizadores junto das flores bem como à observação dos pássaros. Para este efeito, foi colocada no centro do jardim um Eucalipto de flor vermelha (Corymbia Ficifolia), espécie de árvore oriunda da Austrália que possui floração abundante no Verão, de coloração vermelha, e que desprende um aroma intenso, atraindo borboletas, abelhas e outros insectos. Não deixamos ainda de fazer notar o simbolismo da árvore no meio do jardim. Como se tivesse existido a intenção de fazer lembrar o jardim do Paraíso com a árvore do Conhecimento do Bem e do Mal no meio.
Este jardim viria a ser destruído, quase na totalidade, por um ciclone, em Fevereiro de 1941, e depois invadido por plantas infestantes. Porém a árvore central resistiu, embora atingida, em determinado momento, pela queda de uma outra.
Tive o privilégio de, enquanto Director do Centro Hospitalar das Caldas da Rainha, desencadear o processo para a recuperação do Jardim da Rainha – que ficou concluída em 2005.
VT
A Blossom Fell – Nat King Cole
7 comentários:
Muito interessante, Vasco. Gostei muito de tomar nota destes detalhes que partilha connosco. E depois... adoro jardins :)
Mais especiais se tornam, quando conhecemos a sua história.
O Jardim
Consideremos o jardim, mundo de pequenas coisas,
calhaus, pétalas, folhas, dedos, línguas, sementes.
Sequências de convergências e divergências,
ordem e dispersões, transparência de estruturas,
pausas de areia e de água, fábulas minúsculas.
Geometria que respira errante e ritmada,
varandas verdes, direcções de primavera,
ramos em que se regressa ao espaço azul,
curvas vagarosas, pulsações de uma ordem
composta pelo vento em sinuosas palmas.
Um murmúrio de omissões, um cântico do ócio.
Eu vou contigo, voz silenciosa, voz serena.
Sou uma pequena folha na felicidade do ar.
Durmo desperto, sigo estes meandros volúveis.
É aqui, é aqui que se renova a luz.
António Ramos Rosa, in "Volante Verde"
FC
Caro Vasco Trancoso
A realidade de este local estar destruído está presente na minha memória. À fotografia e texto que hoje me apresenta, digo apenas, obrigado Vasco Trancoso.
João Ramos Franco
"Passeio da Copa",como era designado este belíssimo jardim,na segunda metade do século XVIII.
Gostei imenso do historial que faz do Parque D.Carlos I.
Muito mais me impressionou o facto de um Director do Centro Hospitalar tenha tido a sensibilidade de se empenhar na recuperação do Jardim da Rainha.
O HOMEM só se completa se em harmonia com a NATUREZA,ainda que as flores caiam...
Ah,quanto "A Blossom Fell",excelente escolha,inspiradora voz,a de Nat King Cole.
MV
Gosto particularmente da forma como se sente que se relaciona com o "espaço rei" em termos de natureza, aqui nas Caldas. Neste texto nota-se-lhe o estar do lado de dentro e essa noção passa para nós visitantes do jardim, apreciadores sem história que assim, neste relato passamos a estar do outro lado, também do lado de dentro...
Obrigada
Um abraço
Acreditemos nessa intenção,(comum a outros paises,ao longo dos tempos,ainda que com outros elementos da Natureza)e o JARDIM DA RAINHA/JARDIM DO PARAÍSO adquire uma beleza mais profunda. Mais uma vez,sou grata por uma bonita foto maravilhosamente musicada e por uma história que desconhecia.
RP
Obrigado RP e Ana Paula (recomendo aos meus amigos uma visita aos Blogs da Ana Paula) pelas palavras e pelo interesse, e a FC pelo lindo poema. JRF eu é que agradeço às Caldas a oportunidade que tive de fazer o que fiz. Obrigado MV e M. Besuga pela atenção e sensibilidade para com a sensibilidade dos outros.
Bem hajam
VT
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