Agora deu-me para isto.
Analisar fragrâncias. No fundo estou de certo modo “a festejar” o ter
recuperado (ao fim de 8 meses) o olfacto que tinha perdido totalmente em
Janeiro – em consequência de uma gripe. É como ter estado a contemplar uma
paisagem em preto e branco e passar agora a vê-la numa festa de cores que
regressam - aparentemente mais vibrantes. É uma nova “alegria olfactiva” que
descubro. E uma das “cores olfactivas” que me dá muito prazer é o aroma das
perpétuas das areias, “erva caril” (ou “immortelles”) que me costuma acompanhar
no meu regresso da praia, ao fim da tarde, ao longo das dunas da costa
alentejana – onde passo as férias de Verão. Fico sempre com uma sensação
relaxante perante o odor das “immortelles” - por dentro do ar morno que emana
do solo.
Na Antiguidade, as suas flores eram muito utilizadas para fazer grinaldas, com que se coroavam os ídolos. Por conservarem por muito tempo a sua cor amarelo dourada, eram conhecidas pelo nome de imortais ou perpétuas.
Pela invulgar fragrância a
lembrar o caril, as duas espécies, existentes em Portugal, são utilizadas em
culinária, em pratos de arroz e vegetais. A sua inalação é por vezes apontada
como possível atenuante dos sintomas da depressão e tradicionalmente
utilizava-se como afrodisíaco.
Como a ocasião faz o ladrão
resolvi encomendar uma fragrância (Le Mat #LeMat#)
que incorpora o cheiro das “immortelles” e que é referenciada como uma das 20
obras primas da perfumaria – dos últimos 10 anos. É muito interessante, alias,
a descrição feita pelo conhecido critico Luca Turin no seu ultimo livro (2018)
e que não resisto a transcrever mais em baixo – no final.
Depois do frasco chegar, retirei-o da caixa de madeira que o transportou de Itália (com a carta de Tarot "Le Mat") - experimentei e fiquei de imediato seduzido pelo seu aroma balsâmico, quente e doce /sensual - com uma grande projecção. Dada a sua longevidade durante 24 horas não resisti a cheirar frequentemente a pele. Uma descoberta e uma surpresa.
Não por acaso que o perfume da Annick Goutal que mais gosto é o “Sables”. Exactamente porque também incorpora “immortelles”. Aliás o “Le Mat” não só me recordou o “Sables” mas também uma das obras primas do século passado: o “Yatagan” (mais acre e com mais Patchouly) de boa memória que usei durante meia dúzia de anos após o seu lançamento (1976) – antes da Caron dar cabo do perfume com as desastrosas 4 gerações / reformulações que se seguiram à original.
Depois do frasco chegar, retirei-o da caixa de madeira que o transportou de Itália (com a carta de Tarot "Le Mat") - experimentei e fiquei de imediato seduzido pelo seu aroma balsâmico, quente e doce /sensual - com uma grande projecção. Dada a sua longevidade durante 24 horas não resisti a cheirar frequentemente a pele. Uma descoberta e uma surpresa.
Não por acaso que o perfume da Annick Goutal que mais gosto é o “Sables”. Exactamente porque também incorpora “immortelles”. Aliás o “Le Mat” não só me recordou o “Sables” mas também uma das obras primas do século passado: o “Yatagan” (mais acre e com mais Patchouly) de boa memória que usei durante meia dúzia de anos após o seu lançamento (1976) – antes da Caron dar cabo do perfume com as desastrosas 4 gerações / reformulações que se seguiram à original.
É uma fragrância em que o
cheiro quase agreste, vulcânico, e a areia quente – que nos liga à profundidade
da “terra” – é, surpreendentemente, amenizado com o genial contraste doce da
Rosa Centifolia de Grasse. É uma essência fora do comum também porque mantém
todas as suas notas, com ligeiras flutuações, até se esbater. Ou seja,
destaca-se da habitual evolução temporal das notas de topo, coração e fundo –
comportando-se quase como um todo olfactivo ao longo do dia.
Quase cor de fogo – a
lembrar-nos que provavelmente não será coincidência pertencer a uma empresa
(Mendittorosa) sediada em Nápoles - perto do Vesúvio – é decididamente a minha
fragrância (“essência”) preferida com “immortelles”!
Informação proporcionada
pela empresa Mendittorosa:
Le Mat explodes with sweet
earth, heaven-sent patchouli anchoring a sensual chypré homage of Rosa
Centifolia from Grasse, the strange complexities of immortelle, cloves, black
pepper and Egyptian geranium. A talisman of balsamic blessed absolution that
will boldly defend mind and body. Perfumer: Anne-Sophie Behaghel (Flair Paris).
Extrait de Parfum 25%.
"Review" pelo Luca Turin:
“Many years ago I was standing
in line with my girlfriend in a dismal Chinese takeaway in South London, well
past midnight, when a young, pudgy, pale-faced young man behind us caught sight
of my companion’s face. He put his hand to his mouth, took two steps back and
in a shaky voice said “Blanche….. you’ve come back!” He explained that he had
an obsession with a Victorian murderess, rummaged through his pockets, pulled
out a wallet, from it a printed photo folded in four: the exact, uncanny, perfect
likeness of my girlfriend. We left, quite shaken, and ate in awed silence.
I had a similar experience
when smelling Le Mat, which is the unhoped-for reincarnation of a long-lost
fragrance that means a lot to me, Lucien Lelong’s Elle..Elle.., composed by
Jean Carles in 1948 and discontinued a few years later. I once had a bottle
which, sadly, was emptied by a overzealous cleaner who upended it. It was (and
now is again) one of the most affecting and rarest accords in perfumery: rose +
camomile. Camomile has a heartfelt, hot-breath drama to it that, when mixed
with the grandeur of rose, gives the impression of a combustible soul playing
with matches.
I had once tried to recreate
Elle… Elle… with the help of Guy Robert and Jean Carles’ son Marcel, and came
pretty close. But Le Mat is closer still. It is always amazing how, within an
essentially infinite combinatoric space like perfumery, some mathematical
attractors seem to exist, that guide the hand of the perfumer towards forms
that have more force and more meaning. This particular Angel is now back among
us. Smell it before it returns to its celestial sphere.
Update: I’ve just checked
Michael Edwards’ database. Le Mat was composed by Amélie Bourgeois and
Anne-Sophie Behaghel at Flair. Edwards too uses the word celestial to describe
it (a clear message is contained in the bottle, it seems), but to my surprise
does not list camomile among the materials. Can this form be reached from
different directions, possibly via the immortelle note? Mystery never quite
deserts perfumery.”
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