segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

The Real Hemingway “scent”



Krigler é uma marca lendária, selectiva, “bespoke like” e semi-misteriosa - que não é muito comentada. Mantém uma política discreta com pouca propaganda – não pactuando com o negócio de muitos “reviewers” que comentam fragrâncias a metro com elogios muitas vezes “comprados”. Semelhante a um produtor de vinho, Albert Krigler referia: “fabricamos os nossos perfumes como vinho no sul da França, onde extraímos os materiais e os deixamos descansar em barris até dois anos antes de começarmos a misturá-los com álcool com uma concentração de 25%”. Os seus 35 perfumes (EDP), são ainda comercializados pelos seus descendentes, e só podem ser adquiridos no respectivo “site”, e nas lojas de França, Berlim, Hong Kong, New York Plazza e no Four Seasons Beverly Hills. As histórias que transportam estão ligadas à realeza, a grandes estrelas do cinema e a grandes figuras da História desde o início do século XX.
São fragrâncias atraentes e de elite correspondendo ao desejo do fundador Albert Krigler de criar fragrâncias de luxo exclusivas, criadas com os melhores ingredientes do mundo. Nascido em Berlim, Albert Krigler trabalhou inicialmente para a empresa francesa Rallet como aprendiz na sua fábrica de Moscovo.
Tudo começou com amor, naturalmente. Em 1879, Albert inventou Pleasure Gardenia 79 um perfume floral como presente para conquistar a sua futura esposa.
Devido aos tumultuosos eventos ocorridos em São Petersburgo, Albert Krigler mudou-se para Berlim, em 1905, e abriu uma loja na Unter den Linden. Nesse mesmo ano, criou a sua terceira fragrância, Schoene Linden 05, para celebrar a bela avenida daquela cidade. Alguns anos depois, em 1909, Krigler mudou-se para a região de Champagne no sul de França.
A Krigler Perfumes alcançou grande fama no início dos anos 20 e era a favorita entre as celebridades da época. Os “opinion makers” e os criadores de tendências reuniam-se envolvidos em aromas de Krigler, cada um deles inspirado em locais como Monte Carlo, a Riviera Italiana e o Mediterrâneo.
Porém, em 1931, a Krigler começou a vender as suas fragrâncias em Nova York no Plaza Hotel. Em homenagem à sua casa adoptiva, Albert criou o American One 31 (os números nos frascos significam o ano em que foram criados. Neste caso em 1931), um perfume que se viria a tornar numa fragrância de culto. Ernest Hemingway, que frequentava o mesmo círculo que os Krigler, era um ávido utilizador deste perfume – que se tornou a sua assinatura odorífica. Mais tarde quando John F. Kennedy soube que Hemingway costumava usá-lo, passou também a comprar grandes quantidades e a utilizá-lo em ocasiões especiais: Quando pretendia seduzir mais uma das suas inúmeras amantes (na altura fazia, frequentemente, injecções de testosterona e de esteroides devido à sua insuficiência suprarrenal) e no dia em que se tornou presidente.
Uma aura inicial de bergamota / tangerina (mais doce do que ácida) com notas de vetiver e neroli assenta numa base com a força do cedro, do cominho e da pimenta preta. Fresco, especiado e amadeirado é exuberante / dinâmico / masculino e elegante, com um acabamento inteligente que permanece muito tempo na pele. Identifico ainda uma “vibe” discretamente adocicada que não está descrita na composição. Curiosamente fez-me ler um pouco o "Renaissance" da Xerjoff. Foi adoptada posteriormente também por George Clooney e pelo presidente Clinton.
Na década de 1930, Marlene Dietrich apareceu no estúdio Krigler e apaixonou-se pelo perfume Lieber Gustav 14, uma fusão de couro, chá preto e lavanda - que se tornou o primeiro perfume unissex da casa. Também era utilizado por F. Scott Fitzgerald - enquanto escrevia “Tender Is the Night”. Grace Kelly escolhia aromas Krigler exclusivamente para cada ocasião ou para cada papel que interpretava. Por exemplo, usou Chateau Krigler 12 na noite em que ganhou um Oscar no filme “The Country Girl”, em 1955. Audrey Hepburn usava English Promenade19 durante as filmagens de “We Go to Monte Carlo” e de "Roman Holiday" com Gregory Peck. O fabuloso Patchouli 55 foi o perfume de cabeceira da princesa Victoria da Suécia e de Jackie Kennedy e é actualmente o preferido de Annette Bening. Catherine, Duquesa de Cambridge, e a Princesa Charlene do Mónaco são fãs do Extraordinaire Camelia 209. Também é muito conhecido o Oud for Highness 75 encomendado pelo rei Hussein da Jordânia. Outros dos seus perfumes foram também usados por Pablo Picasso, Zelda Fitzgerald, Rudolph Valentino, Max Beckmann e Colette.

quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

Sex, drugs & Perfume



Decidi conhecer as várias fragrâncias da Moresque e no geral achei que são muito intensas / bold, lineares e muito caras. Gostei, no entanto, do Al Andalus (com um belo açafrão bem acompanhado pelo gengibre e pimenta preta), do Rand (um Aventus no feminino - floral e com um abacaxi também bem condimentado) e do White Duke.
Acabei por me decidir pelo bem mais masculino e recente (2019) White Duke – inspirado pela figura fascinante de Gabriele D'Annunzio e que, me faz sentir o ambiente das primeiras décadas do século XX - tal como o imagino.
TOP NOTES:
Bergamot, Geranium from Egypt, Clary Sage
HEART NOTES:
Amber, Balsam of Peru, Thyme, Opoponax
BASE NOTES:
Benzoin, Incense, Patchouli
Um perfume que, após a breve abertura cítrica e condimentada, é marcado pelo protagonismo da sensualidade doce do Âmbar e do mistério do incenso. Com boa duração (cerca de 12h) tem uma projecção moderada. O balsâmico do oponax temperado pelo patchouli conferem uma vibe a lembrar o Yatagan - o que é um ponto a favor para o meu gosto. No final o drydown na pele é suave e doce. Tal como D'Annunzio é uma fragrância provocante, sedutora, e desencadeando sensações fortes.
É irresistível relembrar Gabriele D'Annunzio que foi não só um grande, poeta, escritor (O Triunfo da Morte) e teatrólogo italiano. Desenvolveu paralelamente à carreira literária uma excêntrica carreira política. Protagonista de uma vida de excessos, d’Annunzio fez do estetismo o seu próprio estilo de vida (o seu lema de vida), procurando sempre novas sensações. Com a declarada intenção de constituir em Itália a prosa narrativa moderna, assimilou as características principais do decadentismo europeu e a busca incessante da Beleza. Na primeira década do século XX d’Annunzio era provavelmente o poeta italiano mais famoso na Europa. Visto como um diabo com uma escrita de anjo, D’Annunzio permanece indiscutivelmente irresistível: Sem dúvida, o melhor escritor italiano do seu tempo, um esteta que faria Oscar Wilde parecer um mero burguês, um sedutor com o tacto e apetite de Casanova, um fanático político e um orador de voz suave e apaixonante.
Tornou-se famoso com o romance O Prazer, de 1889, dedicado à atriz Eleonora Duse com quem viveu um romance tempestuoso. Um romance entre muitos que lhe foram atribuídos. Era lendário o seu apetite e performance sexual. Viveu com várias mulheres simultaneamente (cita-se que a paixão de algumas as terá levado ao suicídio). Organizava orgias ao ritmo de cocaína no seu palácio como um precursor de Hugh Hefner com as coelhinhas da Playboy. O seu palácio faustuoso, que reflectia os seus excessos e o seu esteticismo, situava-se (e situa) na margem norte do lago de Garda no norte de itália (o maior lago da Itália, com 5 ilhas, localizado na província de Bréscia), e estendendo-se por uma área de cerca de 370 km a uma altitude de 65 metros sobre o nível do mar).
Em redor da sua casa há um labirinto de jardins secretos e fantásticos, há aviões e barcos da 1ª Guerra Mundial, há cascatas, estátuas, um auditório ao estilo grego, ameias de uma fortaleza e no topo de um monte há o seu mausoléu guardado por enormes de cães de pedra.
A casa é um museu de peças fantásticas, em geral da época, onde não há quase espaço entre elas – quer nas paredes, quer nos móveis, quer na casa de banho com banheira e lavatório em Lápis-lazúli rodeadas por dezenas de frascos de perfumes, loções, etc. Um lugar mágico a merecer uma visita (ver vídeo em anexo).
Foi também um herói da 1ª Guerra Mundial - onde esteve ao lado dos Aliados - tendo-se distinguido comandando frotas de aviões. Alcançou celebridade como piloto de caça (perdeu a visão de um olho num acidente aéreo). Entre os diferentes feitos e ficou célebre a conquista da cidade de Fiume (hoje Rijeka na Croácia), em 12 de setembro de 1919, liderando um exército de 2000 italianos. Nesse local D’Annunzio auto-proclamou-se "Duce" (caudilho / Duke) e inventou o gesto que mais tarde na 2ª Guerra Mundial seria copiado por Hitler e Mussolini. A sua figura (de bigode revirado) também inspiraria mais tarde Salvador Dali. Em 1937 foi eleito presidente da Academia Real Italiana). D'Annunzio morreu de um acidente vascular cerebral (há autores que afirmam que tal aconteceu “às mãos” de uma das várias “playmates” com quem coabitava – uma loira tirolesa de nome Emy Huefler) em sua casa em 1 de março de 1938. Teve funeral de Estado.