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Enganava-me quando no início de 1955 julgava que iria ser um ano sem diferenças significativas dos imediatamente anteriores. Os lares modernizavam-se com o plástico - que iniciava aqui a sua invasão pelo mundo. Desde a “fórmica” laminada e colorida para todo o mobiliário até aos gira-discos, gravadores, electrodomésticos ou adereços de moda – tudo se começou a plastificar. Ao mesmo tempo a indústria automóvel “acelerava” e ao modernizar-se passou a contribuir definitivamente para o aumento de CO2 na atmosfera. Não existia a consciência das consequências ambientais que ambas as situações viriam a determinar na actualidade. Por outro lado desenvolvia-se um novo tipo de consumismo: o dos electrodomésticos. Outro acontecimento significativo, sobretudo analisado agora, foi o aparecimento, nesse ano, da televisão em Portugal com as primeiras experiências nas Feiras Populares (Lisboa e Porto) e a criação da RTP (as emissões regulares só se iniciariam dois anos depois). Como todos sabemos agora a televisão viria alterar muito os nossos hábitos com consequências sociológicas inimagináveis naquele ano. As pessoas passaram a telesintonizarem-se e a telesonharem. A convivialidade diminuiu, bem como a ida ao Cinema e Teatro, a publicidade tornou-se ainda mais invasiva e condicionante, e os Bancos começaram a substituir os cafés tradicionais, instituindo uma nova ordem bancária que viria a desenvolver-se até ao recente “crash”. Outro facto importante, porém, verificou-se a nível musical - em consequência de vários factores: As Sociedades de Recreio despertavam e animavam-se com um maior número de “bailes” devido ao aparecimento de uma grande novidade: o disco de 45 rotações que permitia o acesso mais democrático aos êxitos musicais. Ao mesmo tempo os jovens seguiam a moda ditada por figuras como Marlon Brando com casaco de cabedal e de James Dean com óculos Ray-Ban e jeans (morre nesse ano, depois de fazer a Este do Paraíso, ao volante do seu Porche) e começam a ouvir uma música marcada por um ritmo novo: o Rock´n roll. Num ano em que faziam êxito canções calmas e românticas como: A Blossom Fell (Nat King Cole), Only You e Great Pretender (Platters) e It´s Magic (Doris Day), surgiu o contraste “explosivo” de…
Rock Around the Clock interpretado por Bill Halley.
Canção composta por Max Freedman e James Myers, em 1952, foi gravada por Bil Halley em Abril de 1954 e publicada como lado B de um 1º disco, pretendendo integrar a banda sonora de um filme com o mesmo nome. No entanto torna-se emblemática no filme de 1955: “Blackboard Jungle” intitulado, não por acaso, pela Censura portuguesa como “Sementes de Violência”. Os jornais portugueses classificam o Rock´n Roll como dança “animalesca” e procuram conotar a música com uma “Juventude delinquente, transviada e rebelde”, fazendo ao mesmo tempo a apologia das virtudes da valsa ou do pasodoble. Sendo certo que o Rock´n Roll não começou com Rock Around the Clock, pois as suas raízes remontam a anos antes - no fermento do Rythm and Blues, foi no entanto esta canção que estabeleceu o contacto definitivo do Rock´n Roll com a Juventude, despertando-a não só para um ritmo que não conhecia, mas também para trilhar, eventualmente, caminhos mais libertários. De facto o Rock´n Roll acabava por ser uma maneira de contestar “o mundo injusto que os mais crescidos criavam” e que, esse sim, continha na altura, como vimos, “sementes de violência” (início da invasão da plastificação, desenvolvimento da indústria automóvel poluente, da televisão, de um consumismo cego e de uma ordem bancária perversa). Embora não sabendo ainda que não conseguiria modificar esse mundo, nesse Verão, de 1955, tentei compor o cabelo com Brylcreem e usei a minha primeira água-de-colónia (antes só sabonetes): Lavanda Ach. Brito, e fui ouvir o disco de Bill Halley, a uma festa, com um grupo de amigos, dado que um deles tinha conseguido trazê-lo dos EUA (só chegaria a Portugal, uma remessa de apenas 25, em Janeiro de 1956). Ia com estrelas no olhar e um sorriso mágico. Acreditava que era o 1º dia de um novo mundo melhor que começava.
VT (Este texto é uma “short version” de outro mais desenvolvido, também com o mesmo título (1955), publicado no Blog ERO)