domingo, 19 de julho de 2009

Outros passos

Na serenidade deste anfiteatro emergem espaços antigos voltando dentro de nós. Depois do ranger do portão os nossos passos atravessam mais jardim e entram onde esteve provavelmente uma sala de estar – agora com um tapete de hera. O tracejado do sol coado pela vegetação é certamente idêntico ao que passava pelas persianas da casa tranquila que aqui estava… Talvez a mancha vermelha de talhadas de melancia sobre a mesa. Laranjas e flores. Talvez uma rapariguinha a brincar com as flores a fingir que eram pessoas para um dia mais tarde fingir que as pessoas eram flores. A correspondência esperando sem pressa na cadeira, o chão de madeira encerado de fresco, silêncios, o eco de passos ao longe, sussurros, uma grafonola distante a cantar, o som abafado de um robe caindo sobre a carpete. Lá fora a manhã continua-se pelo jardim luxuriante e pela fonte. Um tempo feliz. Passado e Presente onde fiquei à procura do segredo de quem sabe amar e a perguntar porquê.
VT

Sag warum - Camillo Felgen

5 comentários:

João Ramos Franco disse...

Sim houve ali vida, recordo que no anfiteatro, do lado esquerdo a seguir ao portão, por volta de 1948/9, fui com os meus pais e assisti aí uma representação de teatro. Mais tarde conheci o palacete de que fala, já abandonado, mas de certeza que existiu ali tudo o que com tanta beleza me descreve.
Um abraço amigo
João Ramos Franco

VT disse...

Obrigado João. Apareça sempre com os seus comentários oportunos.
Abraço
VT

Anónimo disse...

Lembrança do Mundo Antigo

Clara passeava no jardim com as crianças.
O céu era verde sobre o gramado,
a água era dourada sob as pontes,
outros elementos eram azuis, róseos, alaranjados,
o guarda-civil sorria, passavam bicicletas,
a menina pisou a relva para pegar um pássaro,
o mundo inteiro, a Alemanha, a China, tudo era tranqüilo em redor de Clara.

As crianças olhavam para o céu: não era proibido.
A boca, o nariz, os olhos estavam abertos. Não havia perigo.
Os perigos que Clara temia eram a gripe, o calor, os insetos.
Clara tinha medo de perder o bonde das 11 horas,
esperava cartas que custavam a chegar,
nem sempre podia usar vestido novo. Mas passeava no jardim, pela manhã!!!
Havia jardins, havia manhãs naquele tempo!!!

Carlos Drummond de Andrade
MV

VT disse...

Curiosamente já tinha também seleccionado essa poesia na colectânea do C D Andrade que acabei de ler.
VT

João Oliveira disse...

O que vêem nessa foto já não existe com grande pena minha, há cerca de um mês cortaram completamente todas as árvores dessa zona da quinta da boneca sem qualquer razão aparente... =(